Calculei a flecha e passou, preciso calcular o resto?

Algums colegas avaliam estruturas apenas calculando as flechas atuantes. Minha experiência ministrando o curso de projeto e cálculo de estruturas metálicas, conversando com pessoas interessadas de todo o Brasil tem mostrado que isso é prática mais comum do que muitos imaginam. Essas pessoas sabem que não estão fazendo o cálculo completo, mas muitas não sabem que seus cálculos podem ser totalmente inválidos, mesmo que estejam fazendo as contas de forma correta. E o mais grave: muitos, sem saber dos riscos, depositam sua confiança fazendo cálculos por softwares acreditando que as deformações são todas computadas alí... 

 

Nesse caso, mesmo que fosse uma análise manual, se somente a flecha for levada em consideração, o cálculo tem grande risco de ser totalmente inválido, mesmo que suas contas estejam certas.

 

Não estou aqui para julgar ninguém, meu único objetivo é levar informação correta para quem deseja, então vou explicar os motivos de essa análise simplista não ser confiável. Com informação em mãos, não há mais a desculpa da falta de conhecimento (que em engenharia não deveria nem ser considerado uma desculpa), e a responsabilidade então é de cada um.

 

Para os programas de cálculo, as peças sempre estão em regime elástico e são infinitamente indeformáveis. 

 

O máximo que os programas fazem é pintar de vermelho as peças que atingiram ou ultrapassaram algum limite de resistência, mas os programas continuarão a imprimir as deformações como se isso nunca tivesse acontecido.

 

Sugiro que faça o seguinte teste: lance uma viga bi-apoiada com uma carga pontual qualquer em qualquer software de cálculo estrutural. Pode ser um gratuito como o ftool, ou um pago como Metalicas 3D ou Mcalc3D. Pode ser qualquer vão, e qualquer bitola, não importa. Anote a flecha obtida.

 

Agora, duplique o valor dessa carga. A flecha vai duplicar. Se você triplicar a carga, a flecha vai triplicar... se você aumentar a carga 1200X, a flecha vai aumentar 1200X. Mas, até por intuição, sabemos que é impossível ocorrer essa deformação de forma indefinida, uma hora a peça escoa, vai à ruptura, ou sofre uma deformação por flambagem (que apesar de muitos confundirem, não é a mesma coisa que a flecha). Mesmo assim se você continuar aumentando a carga, a flecha vai continuar aumentando na mesma proporção... indefinidamente. 

 

Isso ocorre por que esses programas só computam as deformações causadas pelas tensões normais e tensões cortantes, e eles consideram que as peças ficam para sempre em regime elástico, ou seja, a deformação é sempre proporcional à carga (por isso a flecha aumenta na mesma proporção que a carga)... Eles não computam a flambagem causada pela carga em um pilar, nem as deformações locais que causam ondulações nas mesas de um perfil I sujeito à flexão, tampouco consideram se a seção entrou em regime de escoamento, o que significaria que a deformação alí naquele ponto já não é mais proporcional à carga. Para eles não existe o comportamento da rótula plástica, que leva uma viga a dobrar repentinamente as tensões no  aço já atingiram tal ponto de escoamento que pode ser comparado a uma articulação perfeita... Nada disso é computado, apenas a deformação em regime elástico. 

 

Ainda não acredita em mim, quer ter certeza disso que eu estou falando? Então volte ao mesmo programa que você simulou a viga, e agora simule um pilar. Pode ser qualquer altura, mas para esse teste ficar claro tente um pilar bem alto, 12m, 15m talvez, e aplique nele uma seção bem fina... uma barra redonda de 10mm de diâmetro por exemplo...

 

Coloque 1 tonelada aplicada na cabeça desse pilar... Se você perguntar para uma criança de 5 anos o que vai acontecer com esse pilar, é capaz de você ouvir ela responder "vai flambar, com certeza"... mas se você analisar a deformação gerada pelo programa, verá que o software no máximo te mostrou uma redução de comprimento da barra, e talvez pintou ela de vermelho, mas não mostra curvatura alguma...  e se você aumentar a carga 1000X, a redução da peça aumentará 1000X e ainda assim nenhuma curvatura vai aparecer.

 

Resumindo, se você calculou a flecha de uma estrutura, mas alguma peça do sistema que compõe essa estrutura estiver atingindo algum Estado Limite Último (Escoamento, Ruptura, Flambagem, plastificaçao, etc... ) o que o software está te mostrando no que se refere a deformação da estrutura não tem validade alguma. Aquela deformação é uma mentira e você deve tratar ela como um monte de linhas que não representam absolutamente nada. O máximo que o programa vai fazer é pintar a barra de vermelho, mas a deformação causada pelo problema que ele apresentou não está representada alí. 

 

Consequentemente, os esforços atuantes nas barras não é real... Nada alí é real.

 

Existem softwares, é verdade, que são capazes de simular comportamentos de deformações em regimes de escoamento, flambagem, vibração, etc... mas em outras áreas, como aeroespacial por exemplo... não em estruturas.. até por que não faz sentido realmente simular esses efeitos pois as estruturas calculadas corretamente jamais chegam a esses estados de deformação, não há utilidade para esse tipo de análise em nosso campo. Todo calculista treinado sabe disso, e sabe distinguir quando as flechas do programa estão refletindo a realidade e quando todas aquelas linhas são uma grande farsa.

 

Mas e se eu fizer manualmente o cálculo da flecha?

 

Mesma coisa. Muitos se lembram das clássicas fórmulas de flecha como por exemplo o cálculo da barra bi-apoiada com carga uniformemente distribuída y = 5q.L^4/(384.E.I)... mas veja, essa fórmula só te pede carga, vão, Módulo de elasticidade e inércia.... 

 

Triplique a carga, e a flecha triplicará, multiplique a carga por 1000 e a flecha será multiplicada por 1000... exatamente como acontece nos programas. A análise não é só isso. É preciso checar se outros fenômenos ocorrem, caso contrário, você pode fazer a conta certa, à mão, com ábacos, ou com software, seja o método qual for, sem a análise dos estados limites últimos, um cálculo estrutural jamais será confiável.

 

Espero que tenham gostado, espero que esse email tenha enriquecido o conhecimento de alguns de vocês, meus colegas de profissão.

 

Lembrando a todos: Faltam 3 Dias para o encerramento das matrículas do curso de projeto e cálculo de estruturas metálicas.

 

Venha aprender a calcular estruturas manualmente, analisar de forma correta para poder prestar seus serviços a fabricantes e montadores de estruturas metálicas, arquitetos e construtoras, de forma consciente, segura e prática, gerando economia para eles e liberdade na sua carreira profissional

 

clique no botão abaixo e garanta sua vaga, as aulas começam nessa terça feira, dia 2 de Junho

 

grande abraço a todos!

 

Eng. Felipe Jacob